http://www.rio2012if-epfcl.org.br/apresentacao
Apresentação
—O que tenho, senhor?
—Fale!
—Qual o remédio, senhora?
(Silêncio)
—O que devo fazer?
(Corte)
—Quanto tempo vai demorar?
—Continue.
A resposta do psicanalista se diferencia da ciência por levar em consideração o sujeito do desejo que esta rejeita; se diferencia da religião e suas práticas por não ceder à crença num Outro que não existe assim como ao Um ditatorial das massas e seitas; se opõe à resposta do capitalista porque não foraclui, como este, a falta. Ao contrário, o analista, ao ocupar a posição de rebotalho que é própria da sua ética, faz valer as questões tanto do mal-estar do sujeito sofredor quanto do mal-estar da civilização. A isso, Freud responde: “caminhe!”, “fale!”. No lugar de responder às demandas e aspirações do ser–para-o-sexo, o psicanalista faz valer o “eu te peço que não respondas à minha demanda, porque não é isso” (Lacan, “Ou pior...”, 09/02/72).
Freud diagnostica no início do século XX o mal-estar da civilização como renúncia ao gozo sexual; Lacan, no final do século passado, o aponta como resultado do laço social dominante que é o discurso do capitalista e sua foraclusão da castração. Resultado: somos todos proletários diante do capital. Mas hoje, nossa sociedade de consumidores, microcréditos, microempresas, microcéfalos é a expressão da “civilização de metas”. Resultado: todos empresários! Eis o imperativo do supereu que transforma nossas vidas em olimpíadas, matando quem está na frente e acenando com medalhas de chocolate e louros de plástico. Ao vencedor: as batatas! (Machado de Assis, Quincas Borba, 1892).
Quais são as formas de retorno da castração foracluída? A generalização da falta-a-gozar concomitante ao empuxo ao gozo tem efeitos no sujeito individual que não se distingue do sujeito coletivo, conforme Freud, em 1921. Quais as respostas do analista orientado pela ética do desejo e do bem-dizer? A psicanálise denuncia os novos semblantes do sintoma demonstrando que sua estrutura permanece a mesma. Por ser tecido de linguagem ele é sensível à palavra, por condensar um gozo ele é reduzido pelo ato analítico. A responsabilidade do analista implica no acolhimento do sintoma e na sustentação do tratamento possível do gozo do sofrimento. Fundamentado em uma ética anticapitalista, o psicanalista desmascara os semblantes do social com os quais se travestem os discursos da dominação: os gadgets como objetos de desejo, os corpos-mercadorias, os novos produtos sólidos no lugar da fluidez dos laços, as intermináveis respostas às demandas e aspirações do ser–para-o-sexo, as violentas investidas racistas de segregação da diferença.
Opondo-se ao main stream, sem ser passadista, o psicanalista não se alia à ciência e ao capital foraclusivos que fazem crer no delírio generalizado – do somos todos Um – e nas “novas” descobertas do homem neuronal. O discurso do psicanalista é o avesso disso, fazendo dele cúmplice do negro de todas as raças (Heiner Müller). O analista se alia ao artista com seu tour de force de poesia que desvela o não-sentido de todas as coisas, os sentidos religiosos prêt-à-porter e que o sentido é dado pelo desejo de cada um.
O adulto permancece o filho do homem: a psicanálise mostra que ao criançar-se nas palavras o homem as cria com o que poetisa sua singularidade. O que não quer dizer que a psicanálise pretende uma saída individualista. Não há sujeito sem outro, diz Lacan. E sempre haverá um outro, com sua diferença e sua forma de gozo. À cloaca máxima da civilização (conforme a conferência de Lacan em 1973, no MIT), que suga o ser de sua morada de linguagem, o analista com sua clínica, em seu ato e sua interpretação, desvela a castração como constituinte de todo ser falante e o sem-razão de um Outro gozo, que é sempre diferente. E norteado pela lógica da heteridade, aponta a abertura ao novo e para a chegança sempre surpreendente do outro.
Antonio Quinet e Sonia Alberti
Sub-temas:
responsabilidade do psicanalista | a ética na psicanálise | psicanálise e política | clínica do ato | desejo e interpretação | bem dizer e gozo | a aposta clínica no sujeito e os discursos da contemporaneidade | psicanálise e crença | o psicanalista e a ciência | arte e psicanálise | psicanálise e os outros saberes | as respostas do analista às psicoses | ... e às toxicomanias | a criança na psicanálise | o psicanalista e o Real.
—Fale!
—Qual o remédio, senhora?
(Silêncio)
—O que devo fazer?
(Corte)
—Quanto tempo vai demorar?
—Continue.
A resposta do psicanalista se diferencia da ciência por levar em consideração o sujeito do desejo que esta rejeita; se diferencia da religião e suas práticas por não ceder à crença num Outro que não existe assim como ao Um ditatorial das massas e seitas; se opõe à resposta do capitalista porque não foraclui, como este, a falta. Ao contrário, o analista, ao ocupar a posição de rebotalho que é própria da sua ética, faz valer as questões tanto do mal-estar do sujeito sofredor quanto do mal-estar da civilização. A isso, Freud responde: “caminhe!”, “fale!”. No lugar de responder às demandas e aspirações do ser–para-o-sexo, o psicanalista faz valer o “eu te peço que não respondas à minha demanda, porque não é isso” (Lacan, “Ou pior...”, 09/02/72).
Freud diagnostica no início do século XX o mal-estar da civilização como renúncia ao gozo sexual; Lacan, no final do século passado, o aponta como resultado do laço social dominante que é o discurso do capitalista e sua foraclusão da castração. Resultado: somos todos proletários diante do capital. Mas hoje, nossa sociedade de consumidores, microcréditos, microempresas, microcéfalos é a expressão da “civilização de metas”. Resultado: todos empresários! Eis o imperativo do supereu que transforma nossas vidas em olimpíadas, matando quem está na frente e acenando com medalhas de chocolate e louros de plástico. Ao vencedor: as batatas! (Machado de Assis, Quincas Borba, 1892).
Quais são as formas de retorno da castração foracluída? A generalização da falta-a-gozar concomitante ao empuxo ao gozo tem efeitos no sujeito individual que não se distingue do sujeito coletivo, conforme Freud, em 1921. Quais as respostas do analista orientado pela ética do desejo e do bem-dizer? A psicanálise denuncia os novos semblantes do sintoma demonstrando que sua estrutura permanece a mesma. Por ser tecido de linguagem ele é sensível à palavra, por condensar um gozo ele é reduzido pelo ato analítico. A responsabilidade do analista implica no acolhimento do sintoma e na sustentação do tratamento possível do gozo do sofrimento. Fundamentado em uma ética anticapitalista, o psicanalista desmascara os semblantes do social com os quais se travestem os discursos da dominação: os gadgets como objetos de desejo, os corpos-mercadorias, os novos produtos sólidos no lugar da fluidez dos laços, as intermináveis respostas às demandas e aspirações do ser–para-o-sexo, as violentas investidas racistas de segregação da diferença.
Opondo-se ao main stream, sem ser passadista, o psicanalista não se alia à ciência e ao capital foraclusivos que fazem crer no delírio generalizado – do somos todos Um – e nas “novas” descobertas do homem neuronal. O discurso do psicanalista é o avesso disso, fazendo dele cúmplice do negro de todas as raças (Heiner Müller). O analista se alia ao artista com seu tour de force de poesia que desvela o não-sentido de todas as coisas, os sentidos religiosos prêt-à-porter e que o sentido é dado pelo desejo de cada um.
O adulto permancece o filho do homem: a psicanálise mostra que ao criançar-se nas palavras o homem as cria com o que poetisa sua singularidade. O que não quer dizer que a psicanálise pretende uma saída individualista. Não há sujeito sem outro, diz Lacan. E sempre haverá um outro, com sua diferença e sua forma de gozo. À cloaca máxima da civilização (conforme a conferência de Lacan em 1973, no MIT), que suga o ser de sua morada de linguagem, o analista com sua clínica, em seu ato e sua interpretação, desvela a castração como constituinte de todo ser falante e o sem-razão de um Outro gozo, que é sempre diferente. E norteado pela lógica da heteridade, aponta a abertura ao novo e para a chegança sempre surpreendente do outro.
Antonio Quinet e Sonia Alberti
Sub-temas:
responsabilidade do psicanalista | a ética na psicanálise | psicanálise e política | clínica do ato | desejo e interpretação | bem dizer e gozo | a aposta clínica no sujeito e os discursos da contemporaneidade | psicanálise e crença | o psicanalista e a ciência | arte e psicanálise | psicanálise e os outros saberes | as respostas do analista às psicoses | ... e às toxicomanias | a criança na psicanálise | o psicanalista e o Real.
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